“Sobre Charlotte Mason” por Catherine Levison

As muitas pessoas que conheciam Charlotte Mason pessoalmente, amavam-na profundamente e eram capazes de descrevê-la em vívidos detalhes. Quer tenham-na conhecido ainda jovem ou ou perto do fim, as suas impressões sobre ela eram muito consistentes. Jovens e velhos igualmente achavam-na inspiradora, humorística e humilde.

Seu amor pelas crianças era tão evidente que não podia ser ignorado, e muitas vezes era visto como seu atributo mais profundo. Este amor se caracterizava por uma profunda preocupação de que as crianças desenvolvessem uma paixão duradoura pela aprendizagem. Ela baseou sua filosofia na palavra latina para educação “educare”, que significa “alimentar e nutrir”.

Apesar de sua metodologia ter impactado toda a Inglaterra, ela não deixou que isso lhe subisse à cabeça – ela queria que seu trabalho permanecesse, mas não seu nome. Sua amiga Elsie Kitching escreveu: “Charlotte Mason viveu oitenta e um anos. Ela não guardou cartas nem diários. ‘Não quero que minha vida seja escrita, é a minha obra que importa: ela viverá’”.

Apesar de sua humildade, ela ficou bem conhecida em toda a Inglaterra. Desde a família real até as regiões mais pobres, todo o país sentiu sua influência. O senhor Michael Sadler escreveu: “Ela jogou um feixe de luz pela terra”. Sem dúvida, alguns de seus reconhecimentos nacionais foram devidos ao Sr. Household, que era o Secretário do Estado para a Educação na Inglaterra quando teve contato com trabalho de Charlotte Mason, em 1917. Após ter recebido um panfleto a respeito de sua obra, visitou-a pessoalmente por diversos dias em 1919, em Scale How. (Eles também trocaram correspondências por cartas durante anos.) Essex Cholmondeley escreveu mais tarde que o Sr. Household era incansável em espalhar o interesse sobre as filosofias de Charlotte, e os resultados foram que ele recebeu permissão, começando com cinco escolas, para fornecer os livros impressos de Charlotte Mason. O interesse cresceu para 50 escolas, com um total de 10.500 alunos beneficiários do método.

Notavelmente, Charlotte Mason desenvolveu seus insights educacionais durante a juventude, e ainda mais surpreendente é o fato de que após décadas trabalhando com crianças e usando com elas suas ideias, ela não hesitou em sua filosofia. Sua amiga Henrietta Franklin escreveu: “Bem cedo, ela já havia tomado como o texto de sua missão estas palavras de Benjamin Whichcote: ‘Tão logo a verdade… chegue aos olhos da alma, a alma já sabe que ela é sua primeira e velha conhecida’”. (Netta, p.35)

A educação nos dias de Charlotte Mason era bem diferente do que vemos agora. De acordo com um panfleto do Serviço Mundial de Educação (WES), ela viveu na época em que “as crianças praticavam leitura, escrita e aritmética, sentadas rigidamente eretas (não era permitido relaxar a postura!), e escrevendo num pedaço de ardósia que podia ser apagado e reutilizado. Muitas vezes, elas recebiam longas listas para memorizar, tais como de capitais, de datas históricas ou de palavras difíceis para soletrar. Se elas não aprendessem seu trabalho, eram punidas, às vezes, surradas…”

Precisamos lembrar que muito do que Charlotte Mason escreveu foi em reação ao sistema mencionado acima e a outras teorias educacionais de seus dias. Seu material foi escrito para uma sociedade muito diferente da nossa. Em nossos dias, uma pequena minoria acha os ensinamentos de Charlotte Mason negativamente “centrados na criança”. Precisamos retroceder nosso pensamento a uma sociedade insensível, que se importava muito pouco com as crianças e menos ainda com o que elas tinham a dizer (se lhes fosse permitido falar), para compreendermos a gravidade da situação observada por Mason. Um dos muitos biógrafos de Charlotte, Jenny King, escreveu: “Charlotte Mason foi provavelmente a primeira educadora a defender visitas a museus, galerias e concertos… [em que as crianças] estavam livres para relatar suas próprias impressões após a visita”. Vivemos em um tempo diferente, com uma sociedade muito mais permissiva – podemos apenas imaginar que tipo de conselho Charlotte Mason nos daria.

Alguns dos pais que educam suas crianças em casa utilizando-se de Charlotte Mason, não perderam de vista em que era ela viveu – de fato, eles são muito conscientes desse aspecto. Muitos dos que seguem seu método parecem pensar nela um pouco diferente de como eu penso. Enquanto outros têm uma imagem mental de uma mulher intocada, cercada por rendas e parafernálias de chá, eu mantenho uma impressão completamente diferente em minha mente. Eu imagino um resistente par de botas enlameadas, com algum tipo de roupa sensata que a equipasse para o campo. Suas frequentes caminhadas pela paisagem inglesa, em todos os tipos de clima, são bem documentadas. Tenho certeza de que ela era tão feminina como a dama ao seu lado, mas eu posso visualizá-la deixando de lado os pedaços de renda e outras pompas desnecessárias quando era hora de ficar ao ar livre. Minha imaginação foi um tanto comprovada por essa descrição da faculdade de Charlotte: “O ambiente real, os livros, as fotos, o mobiliário simples e as flores silvestres para decorações eram, em si mesmos, uma revelação, naqueles dias em que o mundo vivia imerso em uma multidão de tesouros ancestrais ou na indizível hediondez da era vitoriana” (Charlotte Mason College, p.17). Particularmente, eu amo móveis, livros e casas antigos, mas o fato de que Charlotte viveu e escreveu em outro tempo não é a única razão porque eu me interesso por seus ensinamentos.

Quando Mason tinha dezoito anos, frequentou uma das únicas faculdades criadas para a formação de professores. Ensinaram-lhe que o executor (a criança) era mais importante do que a execução da criança. Ambas as filosofias de Matthew Arnold e John Ruskin encorajavam a ir além dos três R’s (leitura – reading, escrita – ‘riting e aritmética – ‘rithmetic), e uma combinação de suas opiniões exigia que a inclusão da literatura, poesia, religião, arte e natureza se tornassem necessárias. Obviamente, esses ensinamentos fizeram uma duradoura impressão sobre ela.

Houve também um debate entre os educadores da época. Eles estavam em fluxo sobre os objetivos da educação feminina. Charlotte Mason se viu em um momento em que o objetivo da educação feminina estava em questão. As mulheres deveriam ser treinadas em “execução de tarefas” ou deveriam ter “uma aprendizagem sólida”. Enquanto isso, a “opinião médica contemporânea realmente pensava que muito esforço mental era algo perigoso para as mulheres” (Charlotte Mason College, p.6-7). Sem dúvida, ela viveu durante um momento interessante em que muitos conceitos tradicionais estavam sendo questionados. Evidentemente, alguns pensavam que as meninas deveriam receber a mesma educação que os meninos, mas muitos discordavam.

Em meio a todas as teorias, experiências e debates, Charlotte Mason tomou sua decisão: uma educação liberal para todos foi a sua resposta. Claro que ela não inventou as Artes Liberais, ela só queria que as crianças as apreciassem mais do que os demais educadores de seus dias. Seu amor pelas crianças e pelos desfavorecidos levou-a a algumas ideias inovadoras para seu tempo. Ela deu a ambos, aos empobrecidos e aos pequenos, o benefício da dúvida e assumiu que eles não estavam abaixo da compreensão literária e das belas artes. A maioria de nós concordaria com ela agora, mas no final do século XIX esse era um pensamento revolucionário.

Charlotte passou uma grande parte de sua vida doente, e muitos dos que escreveram sobre ela pensaram que deveriam incluir observações sobre sua saúde. Uma das descrições mais tocantes foi escrita por Household. Seu relato sobre uma visita a Charlotte Mason foi publicado tanto na obra “In Memoriam de Charlotte M. Mason” quanto na “História de Charlotte Mason”. Embora fosse doente, ele relata que seu rosto não mostrava nenhum sinal de cansaço ou dor, e que ela os havia repudiado silenciosamente. Ele nos diz: “Seu rosto era cheio de luz, de ampla simpatia e compreensão, de humor delicado, de gentileza e amor. Quando ela falava com você, ela expunha o melhor que havia em você, algo que você não sabia que estava lá… ela te arrebatava ao nível dela, por todo o tempo que você permanecia ali; e você nunca mais retornava completamente”. Ele continua dizendo: “Em qualquer dificuldade, ela sempre enxergava o caminho certo. Com poucas palavras, sempre perfeitamente escolhidas, e ainda, fluindo naturalmente e sem traço de esforço, ela dizia o que você sabia imediatamente ser a coisa certa, embora tivesse tateado por muito tempo e não a tivesse encontrado”, e “Esse ainda não é o momento de me medir toda a sua realização. A colheita ainda não chegou. Mas há suficiente para justificar a convicção de que a posteridade verá nela uma grande reformadora, que conduziu os filhos da nação de um deserto estéril para uma rica herança… os filhos de muitas gerações agradecerão a Deus por Charlotte Mason e seu trabalho “.

Isso certamente se tornou realidade. As pessoas ficam verdadeiramente gratas quando veem os benefícios em seus filhos e sua capacidade de aprender. Uma mãe compartilhou comigo: “A reclamação tem reduzido muito. Eles chegam a dizer que eu não estou cobrando o bastante, mas o engraçado é que eles estão aprendendo mais”. Outro escreveu: “Estamos nos divertindo!” Pais e filhos ao redor do mundo ainda estão descobrindo como podem incorporar literatura, natureza e apreciação da arte para sua alegria e não apenas porque isso é esperado deles.

Um dos alunos de Charlotte escreveu sobre ela: “De algum modo, em sua presença, a mediocridade e a mesquinhez ruíam, você passava a acreditar e se esforçar para alcançar o mais alto que pudesse. E não só isso – você aprendia a acreditar na bondade e alegria da vida. Você sentia que, no fundo de todo o ensinamento da senhorita Mason, havia uma filosofia de vida baseada na intensa convicção da relação pessoal de cada alma individual com Deus – uma relação que é a base de toda a alegria na vida” (In Memoriam De Charlotte M. Mason, página 77). Outro testemunho da alta estima que muitos detinham por ela, mas também uma menção de seu relacionamento com Deus. Não é possível separar Charlotte Mason, a pessoa, ou mesmo suas filosofias educacionais do cristianismo. Fiz uma pesquisa extensa sobre este assunto e sei que é verdade, mas também decidi que o assunto fala por si mesmo nos escritos dela. Entre a ampla prova de sua fé pessoal está o conhecimento de que seus dois amigos íntimos eram de outras crenças, sendo um judeu e o outro quaker. Essas amizades são mais uma evidência de sua magnanimidade, enquanto não mudam o fato de que o cristianismo de Charlotte é inquestionável.

Charlotte Mason também era professora de escola dominical. Atualmente, várias igrejas e indivíduos estão empregando seus métodos e considerando-os muito satisfatórios para todos os envolvidos. Imagine uma sala de aula de escola dominical sem glitter, cola e limpadores. Em vez de atividades entediantes, um caderno de rascunho é oferecido para cada aluno com seus nomes na capa. Ao invés de chamá-lo de caderno da natureza, refira-se a ele como “Livro da Criação de Deus” e retrate objetos que Deus criou. Inclua passagens bíblicas referentes à criação ou natureza, e hinos referentes à natureza. Imagine uma sala que utiliza a Bíblia real e em que as crianças narram o que o professor leu – muito eficaz, muito confiável. Em terceiro lugar, o uso ocasional de obras-primas que retratam as cenas da Bíblia com elegância e precisão facilmente substituem os inúteis recursos visuais.

Charlotte morreu dormindo, e seu funeral foi descrito por uma de suas alunas. Ela escreveu: “Nós caminhamos em procissão, as crianças (da escola prática) seguindo o mais próximo possível com flores nas mãos, a equipe e a faculdade de dois em dois, carregando as coroas, deixando lentamente o portão e entrando no vilarejo. O vento e a chuva sopravam frios desde o lago, e as pessoas observavam de suas portas, os homens tiravam os chapéus e as mulheres cuidavam de nós enquanto caminhávamos para a igreja. Nós colocamos as flores ao lado do túmulo e saímos um por um. O túmulo parecia extremamente pequeno para ser o lugar de repouso daquele grande espírito” (Charlotte Mason College, página 17).

Um livro inteiro foi dedicado a lembranças como esta. Charlotte Mason foi muito amada e sua partida foi profundamente sentida por seus amigos e conhecidos. Suas reflexões foram publicadas no livro “In Memoriam de Charlotte M. Mason”, e se você realmente quer entendê-la como pessoa, você vai querer uma cópia emprestada de alguma biblioteca.

Uma amiga minha reside na Inglaterra e visitou o túmulo de Charlotte. Ela está enterrada na Igreja Paroquial de Santa Maria, em Ambleside, e a lápide diz: “Em amorosa memória de Charlotte Maria Shaw Mason, nascida em 1 de janeiro de 1842, morta em 16 de janeiro de 1923, seus olhos verão o Rei em Sua beleza. Fundadora do Sindicato Nacional Educacional dos Pais, da Escola da União de Pais e da Casa da Educação. Ela dedicou sua vida ao trabalho da educação, acreditando que as crianças são caras a nosso Pai celestial, e que elas são uma preciosa possessão nacional. A educação é uma atmosfera, uma disciplina, uma vida. Eu sou, eu posso, eu devo, eu vou. Por amor às crianças”.

Como Household comentou, Charlotte Mason te conduz ao nível dela. Como muitos, sou grata por ter descoberto seus ensinamentos e acho que você vai concordar que é verdadeiramente fenomenal que, tanto tempo depois da morte de uma mulher, verificamos que ela ainda seja capaz de conduzir uma geração inteira ao seu nível.

 

Reproduzido e traduzido com a permissão de Catherine Levison

Traduzido por Arielle Pedrosa

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